No artigo de hoje vamos conhecer um pouco do suntuoso banquete do casamento de Maria dos Medicis com Henrique IV. Era 05 de 0utubro de 1600, quando Maria, casou em Florença, por procuração com Henrique IV, rei da França. Uma outra Medici no trono da França.

Um pouco de Maria dos Medicis

Maria dos Medicis, filha do Grão-Duque Francesco I e Giovanna da Austria nasce em Florença no dia 26 de abril de 1573. A pequena Maria fica orfã de mãe aos seis anos de idade. Seu pai Francesco I, casa pela segunda vez com a veneziana Bianca Cappello.

Por nove anos, até a morte de Bianca Cappello, Maria vê na madrasta uma grande intrusa. É bom lembrar que Bianca Cappello era amante de Francesco, e que muito provavelmente Maria teve muitas oportunidades de ver a sua mãe se lamentar pela infidelidade do marido.

Aos doze anos de idade, Maria fica orfã de pai. Será criada pelo tio paterno, que será o sucessor de seu pai, tendo em vista que Francesco não teve filho legítimo do sexo masculino. Na verdade, ele teve um filho do segundo casamento, mas que não teve direito ao trono da Toscana.

Maria teve uma infância triste e solitária no Palazzo Pitti. Dedicava grande parte do seu tevo as coisas que amava, principalmente a música. Do pai, herdou o amor pela ciência. Tinha grande interesse pela botânica e visitava com frequencia o jardim botânico fundado pelo seu avô Cosimo I.

Um pouco de história

Com a morte de Henrique III, filho dos Catarina dos Medicis, a dinastia dos Valois de França se extingue sem conseguir por um final nas guerras de religiões. O problema da sucessão foi resolvido recorrendo a lei sálica que dizia que nenhuma terra poderia ser herdada por uma mulher, mas por um filho do sexo masculino.

O rei de Navarra, era primo e cunhado do último rei da dinastina dos Valois, Henrique III. O rei de Navarra era casado com Margarida de Valois, filha de Catarina dos Medicis e irmã do do rei Henrique III.

Assim com a morte de Henrique III de Valois, subiu no trono da França o rei de Navarra, um Bourbon hugonote, que foi coroado com o nome de Henrique IV. Hugonote era o nome dado ao franceses prostestantes durante a guerra de religiões. A legitimidade do título foi reconhecida pela Liga Católica somente no momento da sua conversão oficial ao cristianismo. Segundo a tradição, Henrique IV disse a famosa frase: “Paris vale mais que uma missa.”

As negociações do casamento

Maria de Medici, Rainha da França - Frans Pourbus, o Jovem - 1610
Maria dos Medicis, Rainha da França – Frans Pourbus, o Jovem – 1610

O novo soberano foi considerado politicamente um dos maiores da França, mas tinha uma grande fraqueza: as mulheres. Teve numerosas amantes que receberam promessas de matrimônios e obviamente não cumpridas, tendo em vista que o soberano já era casado. Porém, Henrique IV conseguiu anular o casamento com Margarida de Valois, para esposar uma outra Medici, Maria filha do Grão-Duque Francesco I e Giovanna da Austria.

O acordo do casamento de Maria dos Medicis com Henrique IV , foi tratado com muita diplomacia. Poderíamos comparar com uma partida de poker: muitos lances e muitos blefes. Foi falado de dotes e de muito dinheiro.

Ferdinando dos Medicis, tio de Maria, havia investido muito dinheiro no reino de Henrique de Navarra, quase um milhão de ducados. O investimento agora dava frutos, mas antes, era necessário anular o matrimonio com Margot, a filha de Catarina dos Medicis. Existiam muitas canditadas para serem a nova esposa de Henrique de Navarra.

Em 1600, começam as agitações no Palazzo Pitti: Maria dos Medicis era uma das canditadas a ser a nova esposa do rei da França. Era a primeira vez que acontecia na família Medici um casamento real. Catarina dos Medicis também foi rainha da França, mas quando se casou, Henrique, filho de Francisco I, ele não era rei e nem Delfim do monarca francês. O marido de Catarina, herdou o trono após a morte do seu irmão que era o primogênito.

Após a sentença da anulação do casamento de Henrique IV e Margarida de Valois, feita pelo Papa Clemente VIII, as negociações do matrimônio de Maria eram quase concluídas.

Henrique IV não queria que Maria fizesse como Catarina dos Medicis, que tinha levado com si um grande número de pessoas, chegando a formar um pequena corte floretina em Paris. O dote pedido pela corte francesa era altíssimo: um milhão de scudi de ouro. Ferdinando pensou imediatamente em dizer não, masfoi aconselhado por Baccio Giovannini de esperar mais alguns dias.

Ferdinando então, recorda ao seu embaixador que a França já tem um débito de com a família Medici de quase dois milhões de scudi: entre empréstimos e juros.

O tempo é sempre o melhor remédio: em Paris, os ministros de Henrique IV anunciam que o dote baixou para 600.000 scudi. Nos primeiros dias de março de 1600, se estipula o acordo e as assinaturas: 350.000 scudi serão pagos no dia seguinte do matrimônio e outros 250.000 scudi diretamente a Henrique IV.

Maria renuncia a herança da família na Toscana. Henrique IV lhe garante uma renda anual de 20.000 scudi de ouros. Não lhe resta mais nada a fazer, somente aguardar o dia do matrimônio.

O casamento de Maria dos Medicis

O Casamento de Maria dos Medicis - Empoli - Galleria degli Uffizi
O Casamento de Maria dos Medicis – Empoli – Galleria degli Uffizi

O casamento de Maria dos Medicis significou para a família florentina um outro título de rainha e o soberano francês uma soma de 600.000 scudi e um desconto nos débitos contraídos (quase 2 milhões de scudi).

Henrique IV conhecia a futura esposa somente através de um pequeno quadro que representava Maria quando tinha 17 anos de idade. Maria agora havia 25 anos, e provavelmente não tinha o mesmo aspecto de anos atrás.

O Casamento de Maria dos Medicis - Rubens - Louvre
O Casamento de Maria dos Medicis – Rubens – Louvre

O matrimônio foi celebrado por procuração em na catedral Santa Maria del Fiore em Florença no dia 05 de outubro de 1600 pelo Cardeal Aldobrandini e representou um grande evento para a família Medici, que era famosa, desde o tempo de Lorenzo Il Magnifico, por organizar festas. O pintor Rubens, que estava presente no casamento de Maria dos Medici, imortalizou esse momento no quadro que hoje se encontra no Louvre.

O banquete

O banquete, realizado no Salão dos 500 no Palazzo Vecchio foi composto de mais de cinquenta pratos diversos. entre os quais alguns doces que foram feitos em forma de esculturas de açúcar feitos pelos mais importantes escultores da época como Giambologna e Pietro Tacca. As esculturas de açúcar, algumas de tamanho considerável (aquela com Henrique IV a cavalo media cerca de 115 centímetros assim como as outras inspiradas nos 12 trabalho de Hércules, nas divindades, nas caças e temas pastorais despertaram a admiração da rainha e dos convidados, símbolos da expressão refinada do gênio dos artesãos florentinos em uma ocasião de importância política e diplomática sem precedentes para a Casa Médici.

Esculturas de açúcar e gesso - Giambologna, Touro e Leão. Exposição Dolci Trionfi - Palazzo Pitti. Casamento de Maria dos Medicis
Escultura de açúcar e gesso – Giambologna, Touro e Leão. Exposição Dolci Trionfi – Palazzo Pitti

A cenografia do banquete também foi enriquecida pelos guardanapos, que foram dobrados de modo a formar figuras bizarras e de animais. Em 2015 foi feita no Palazzo Pitti uma exposição com o nome de Dolci Trionfi, onde foram reproduzidas algumas esculturas e guardanapos do casamento de Maria dos Medicis.

Guardanapos com animais bizarros - Exposição Dolci Trionfi - Palazzo Pitti
Guardanapos com animais bizarros – Exposição Dolci Trionfi – Palazzo Pitti

No final do banquete, que foi um dos mais suntuosos e cenográficos da história, as velas foram apagadas e do teto do Salão dos 500 desceram duas nuvens rosas das quais saíram Giunone (Hera para os gregos), esposa de Zeus e Pallade (para os gregos Atenas), deusa da sabedoria, enquanto uma série de espelhos, refletiam a imagem de Maria dos Medicis por todo o salão dos Quinhentos.

Guardanapos com animais bizarros - Exposição Dolci Trionfi - Palazzo Pitti
Guardanapos com animais bizarros – Exposição Dolci Trionfi – Palazzo Pitti

A festa de casamento de Maria dos Medici durou ainda 10 dias, quando foi apresentada Euridice, o primeiro melodrama da história no Palazzo Pitti. A música foi composta por Jacopo Peri, enquanto o libreto era de Ottavio Rinuccini.

A partida para a França

Maria dos Medicis desembarca em Marselha - Rubens - Louvre
Maria dos Medicis desembarca em Marselha – Rubens – Louvre

No dia 16 de outubro de 1600, finalmente Maria, cheia de sonhos, partiu para a França do porto de Livorno em direção a Marselha. O navio, que foi preparado especialmente para ela, havia a proa dourada e os lados prateados. O convés era decorado com o símbolo da França e da Toscana, com preciosos rubis e diamantes. As cabines eram repletas de tapetes feitos de seda e ouro. As decorações das salas eram feitas de marfim e ébano.

Cinco barcos do Papa, cinco da Ordem dos Cavaleiros de Malta, seis florentinas e uma francesa partiram do porto de Livorno.

Quando a pequena frota chegou em Marselha, Maria era a única que não estava cansada. Maria dá a primeira mostra da sua resistência, que mais tarde a fará famosa.

Maria chega em Marselha no dia 09 de novembro de 1600. A cidade é repleta de bandeiras e todos parecem que deixaram o seu trabalho para ir até o porto receber a nova rainha. O povo de Marselha aplaude a nova rainha católica.

Henrique enviou uma mensagem, dizendo que não irá a Marselha mas que encontrará a jovem esposa em poucos dias em Lion.

Obs: Existem controvérsias quanto a data da partida de Maria dos Medicis. Alguns historiadores citam o dia 16, outros 17 e ainda o dia 19 de outubro. Preferi escolher a primeira data mencionada, mas pode ser que não esteja correta.

A infidelidade do rei

Maria encontrou o marido em 9 de dezembro em Lione a cerimônia de casamento na França ocorreu em 17 de dezembro na catedral de Lion. O casamento na França, tinha boa comida, mas não tinha o luxo da festa florentina.

Mas, diferentemente dos contos de fadas com princesas e rainhas, os cônjuges não viveram felizes para sempre. A chegada de uma segunda rainha italiana não alegra o coração dos franceses. Maria chega na França com 25 anos de idade, e não podemos descrevê-la como uma mulher bonita. Porém, Maria possui a atraente qualidade da riqueza, devido ao dote atribuído por Ferdinando I, seu tio.

O rei Henrique IV, conhecido como um grande tombeur de femmes, possuía muitas amantes, mas a favorita era Gabriela d’Estrèes que sem nenhum escrúpulo se apresentou a Maria, que mal tinha chegado da Itália.

Maria não tem um caráter muito fácil, hoje diríamos que não tinha sangue de barata e não aceita as infidelidades do marido. Ela não consegue tolerar a presença das amantes e filhos ilegítimos na corte. E não era somente orgulho, Maria realmente se apaixona pelo marido infiel e a sua dor pela morte dele será grande e sincera.

A coroação de Maria dos Medicis

A coroação de Maria dos Medicis - Rubens - Louvre
A coroação de Maria dos Medicis – Rubens – Louvre

Maria dos Medicis foi coroada rainha da França em 13 de maio de 1610 na Basílica de Saint Denis pelo Cardeal François de Joyeuse. Um dia depois, Henrique IV foi assassinado por François Ravaillac. Dessa forma, Maria dos Medicis assume a regência da França, pois seu filho Luís havia somente oito anos de idade.

Os filhos de Maria dos Medicis

A família real de Maria dos Medicis e Henrique IV
A família real de Maria dos Medicis e Henrique IV – Frans Pourbus, o Jovem

Apesar da infidelidade de Henrique IV, Maria teve seis filhos: o futuro Luís XIII da França, Gastão, duque de Orleans; Isabel que será esposa de Filipe IV da Espanha; Henriqueta Maria, futura esposa de Carlos I da Inglaterra; Nicola Henrique que morreu em tênera idade e Cristina que casará com o duque de Saboia.


Cristiane de Oliveira

Brasileira do Rio de Janeiro, vive em Florença ha 17 anos. Apaixonada por arte, historia e bons vinhos. Guia de turismo e sommelier na Toscana.

3 comentários

Richard Lomax · outubro 4, 2023 às 10:22 pm

Muito obrigado por a arte e Gran estilo de seu escrito sobre Maria de Medici, cheio de informação e comentários interessantes.

Ao mesmo tempo lei recém num artigo publicado em Brasil onde moro, que Maria de Medici era a primeira noiva a vestir um vestido branco.
Visto a magnífica pintura de Rubens, onde s/vestido és maiormente dourado, Maria de Medici nao parece ser essa primeira noiva vestido de branco..
Me pergunto sim os Sres tem alguma informação sobre quem era a primeira noiva vestido de branco. ?
Com os melhores votos para a guia Florença
Lhe saúda
R.Lomax

Richard Lomax · outubro 4, 2023 às 10:23 pm

Muito obrigado por a arte e Gran estilo de seu escrito sobre Maria de Medici, cheio de informação e comentários interessantes.

Ao mesmo tempo lei recém num artigo publicado em Brasil onde moro, que Maria de Medici era a primeira noiva a vestir um vestido branco.
Visto a magnífica pintura de Rubens, onde s/vestido és maiormente dourado, Maria de Medici nao parece ser essa primeira noiva vestido de branco..
Me pergunto sim os Sres tem alguma informação sobre quem era a primeira noiva vestido de branco. ?
Com os melhores votos para a guia Florença
Lhe saúda
R.Lomax

Nunca antes eu escrevi a s/publicação, Sres

    Cristiane de Oliveira · outubro 16, 2023 às 7:39 am

    Oi Richard, muito obrigada pelo comentario. Maria de’Medici lançou muita moda como por exemplo a Gola Medici, mas ela com certeza não foi a primeira a usar o vestido branco de noiva. Uma das primeiras testemunhanças foi Filipa de Lencastre da Inglaterra que em 1406 vestiu uma tunica com o manto branco. Depois Maria Stuart da Escócia também vestiu em 1558 para esposa o filho de Catarina de’Medici. Em um dos quadros conservados na Galleria degli Uffizi, vemos o matrimônio de Maria de’Medici realizado em Florença por procuração onde ela usa um vestido branco de cetim com detalhes em dourado. Um grande abraço

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