Abrir uma garrafa de vinho e voltar no tempo é possível graças a um experimento científico único no mundo, realizado na ilha de Elba, na Toscana: é o chamado Nesos, o vinho marinho.

Foto: Vetrina Toscana

Pesquisas científicas, descobertas arqueológicas, arte, paixão pelo cultivo e pela cultura da vinha em um território incomparável como o do parque do arquipélago da Toscana deram vida a um produto único que conta uma história milenar. Estamos falando do Nesos, o vinho marinho produzido pela vinícola Arrighi em colaboração com o professor de viticultura da Università di Milano Atilio Scienza e Angela Zinnai e Francesca Venturi da Università di Pisa.

As 40 garrafas de vinho, apresentadas pela primeira vez em Florença no início de novembro, foram produzidas de acordo com uma técnica usada na Grécia antiga, na ilha de Quios que envolve a imersão de todos os cachos de uva em mar aberto.

A vinificação

Depois de cerca de 2500 anos, este método foi proposto novamente em Elba, usando a ansonica, uma uva branca cultivada na ilha, com características semelhantes às uvas antigas do mar Egeu, Roditis e Sideritis, caracterizadas por uma polpa crocante e uma casca resistente que lhe permite permanecer no mar.

Imagem retirada do video

As uvas foram imersas no mar por cinco dias completos a cerca de 10 metros de profundidade, dentro de recipientes de vime. O processo permitiu eliminar parte da pruina, uma espécie de véu feito com cera natural que cobre e protege as uvas. O sal marinho, por osmose, penetrou parcialmente no interior da uva, sem danificá-la.

Imagem retirada do video

Ao serem retiradas do mar, as uvas foram colocadas em ânforas de terracota. Após um ano de envelhecimento em garrafa, foi produzido um vinho extremamente natural, muito semelhante aos produzidos há 2500 anos pelos antigos gregos.

A partir das análises realizadas, constatou-se que o teor de fenóis totais no Nesos, o vinho marinho é duas vezes maior em comparação aos vinhos produzidos tradicionalmente. Isso se deve à maior extração associada à redução parcial da resistência da casca.

Do ponto de vista sensorial, o vinho finalmente mostra abundantes reflexos dourados com notas de frutas maduras de polpa brancas e amarelas com uma pitada de salinidade.

O uso da terracota

Foto: Arrighi

O uso da terracota na produção de vinho é uma prática muito antiga. Hoje, muitas vinícolas da Itália e do mundo redescobriram o refinamento do vinho em grandes ânforas feitas à mão.

A empresa Arte Nova de Impruneta, uma pequena cidade do Chianti, é a líder mundial na produção de ânfora para vinificação. Alías, a cidade de Impruneta é famosa no mundo inteiro pela produção de objetos feitos de terracota.

A terracota de Impruneta tem sido analisada nestes anos, tanto do ponto de vista do suprimento de metais pesados, ​​quanto do ponto de vista da vedação e transpiração. Possui uma extraordinária capacidade de isolamento térmico e permite que o vinho não sofra mudanças excessivas de temperatura durante o armazenamento.

Os vinhos de Quios

Os vinhos de Quios, uma pequena ilha no leste do mar Egeu, faziam parte de uma estreita elite de vinhos gregos considerados produtos de luxo no rico mercado de Marselha e, posteriormente, em Roma. Varrone os chamou de “vinhos dos ricos” e, segundo Plínio, o Velho, César os ofereceu durante o banquete para celebrar seu terceiro consulado.

Como os vinhos de Lesbos, Samos ou Tasso, os vinhos de Quios eram doces e alcoólicos – a única garantia para suportar o transporte marítimo, mas tinham algo que os outros vinhos não tinham, um segredo que os produtores de Quios guardavam zelosamente e que fazia deste vinho muito aromático: a presença de sal proveniente da prática de imergir as uvas em cestas, no mar, com o objetivo de remover a pruina da casca e acelerar a secagem ao sol, preservando o aroma da videira.

O vinho marinho na história

A ligação entre este vinho mitológico e a ilha de Elba também é histórica. Era muito o comum o comércio de mercadorias com a cidade de Marselha, na França. Assim todos os comerciantes gregos, também os do vinho de Quios, faziam uma escala à ilha de Elba e a Piombino para carregar materiais ferrosos, durante o retorno à sua terra natal, entrando assim, em contato com o mundo etrusco.

As descobertas de ânforas em restos de embarcações naufragadas, nos túmulos da vila rustica romana de San Giovanni testemunham que muitas cidades costeiras da Toscana na época etrusca estavam entre os locais mais frequentados pelos comerciantes de Quíos. De fato, as escavações trouxeram à luz ânforas de vinho e, em particular, a defossa dolia: grandes vasos que estavam enterrados e que continham mais de mil litros de vinho cada um. Os cinco vasos encontrados poderiam conter cerca de 6.000 litros.

Durante a conferência em Florença, foi apresentado o documentário “Vinu Insulae”, dirigido e produzido por Stefano Muti (Cosmomedia).


Cristiane de Oliveira

Brasileira do Rio de Janeiro, vive em Florença ha 17 anos. Apaixonada por arte, historia e bons vinhos. Guia de turismo e sommelier na Toscana.

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