Ph: Palazzostrozzi.org

Tracey Emin marca a fachada renascentista do Palazzo Strozzi em Florença com a frase “Sex and Solitude” em néon. Ao chegar lá, a poucos passos da estação de Santa Maria Novella, você já sabe que está prestes a viver algo especial. Esta é a maior exposição já realizada na Itália sobre a ex “bad girl” da arte, recentemente nomeada Dame pelo rei Charles. Mas é também uma reflexão profunda sobre amor, desejo, sexo, sacrifício e doença.

Detalhes da Exposição

Intitulada Tracey Emin – Sex and Solitude (de 16 de março a 20 de julho), a mostra vale a pena. Emin não tem passado fácil: durante a pandemia, enfrentou um câncer agressivo na bexiga, que exigiu operações invasivas e causou sofrimento — detalhes que a artista compartilhou nas redes sociais, sempre honesta e crua.

I Followed You to the End – Ph: PalazzoStrozzi.org

A doença não apagou seu fogo criativo. Para esta mostra em Florença, curada por Arturo Galansino, diretor geral do Palazzo Strozzi, Emin não apenas “assinou em néon” a porta de entrada, mas também criou uma escultura monumental em bronze, I Followed You to the End, uma figura feminina que domina o elegante e racional espaço do pátio renascentista. Impossível não vê-la ao passar pela rua: é um prólogo para tudo que acontece no primeiro andar do palácio, onde uma sequência de sessenta obras narra — como sempre na arte de Tracey Emin — sua história, e, em última análise, a nossa.

A História de Tracey Emin

Nascida em 1963 em um subúrbio de Londres, filha de pai turco-cipriota e mãe inglesa de descendência rom, Tracey Emin teve uma infância difícil. Fugiu de casa aos 15 anos, mas já havia sofrido uma violência que a marcaria para sempre. Determinada a se tornar artista, estudou moda, gravura e desenho, especializando-se em pintura no Royal College of Arts de Londres no final dos anos 80, com uma tese sobre Munch, seu artista de culto.

Nos anos 90, seu talento explodiu junto com a complexidade de sua personalidade. Ela alternou momentos de solidão e abstinência sexual com anos de vida agitada. Em 1999, sua instalação My Bed, que mostrava seu leito desfeito entre lixo e garrafas vazias, causou alvoroço na Tate Gallery de Londres, colocando-a sob os holofotes do mundo. Desde então, sua carreira só cresceu, culminando em sua representação da Inglaterra na Bienal de Veneza de 2007.

A Exposição em Florença

Tracey Emin nunca mudou seu estilo: em seus desenhos, pinturas e esculturas (as de grandes dimensões são uma novidade recente), ela nunca escondeu a si mesma, sendo uma campeã de uma arte sem filtros onde dor, raiva, sofrimento e desejo se entrelaçam. A exposição no Palazzo Strozzi é um excelente relato disso, e é recomendável ler com atenção os longos títulos das obras, que são parte da própria obra, pura poesia.

Uma instalação que deixará você sem fôlego é Exorcism of the Last Painting I Ever Made, apresentada pela primeira vez na Itália, mas criada em 1996, em um momento muito particular da vida da artista. Naquela época, durante a gravidez, ela teve que interromper sua atividade artística devido ao cheiro da tinta, que a fazia sentir náuseas. O aborto que se seguiu a manteve afastada da arte por seis anos. Quando finalmente voltou a pintar, produziu incessantemente desenhos inspirados em seus mestres, como Egon Schiele, Yves Klein e Edvard Munch. Ver essas obras agora, em Florença, é especialmente tocante.

Ph. PalazzoStrozzi.org

O percurso da exposição é pontuado por muitas frases em néon, onde Tracey expressa sentimentos amorosos de maneira direta e explícita. Uma das obras iniciais, Love Poem for CF, é dedicada a seu grande amor dos anos 90, o marchand Carl Freedman, que a incentivou a usar néon pela primeira vez.

A maioria das obras expostas são pinturas vibrantes, onde o título, sexo e solidão, se entrelaçam continuamente, como se um não pudesse existir sem o outro. Ao se aproximar das telas, você pode notar as correções, os repensamentos e as marcas da relação física e carnal que Tracey sempre teve com a arte.

Conclusão

Ph: PalazzoStrozzi.org

Indomável “bad girl” da arte contemporânea, Tracey Emin, através de seus excessos e de uma narrativa sem filtros, expõe sua alma para nos fazer refletir, com generosidade absoluta. Fiel à sua essência, mesmo em tempos em que sua visão de arte (ativista, feminista, dissidente, sem censura) não era popular, Tracey Emin permanece uma das poucas artistas que nunca traíram a si mesmas: “Por muito tempo, meu trabalho foi absolutamente fora de moda — disse ela — mas não me importava, pois sabia que era a coisa certa para mim.”


Cristiane de Oliveira

Brasileira do Rio de Janeiro, vive em Florença ha 17 anos. Apaixonada por arte, historia e bons vinhos. Guia de turismo e sommelier na Toscana.

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