Hoje vamos conhecer um pouco da biografia de Alessandro o Mouro, o primeiro duque de Florença. Em 1519, ninguém imaginava que Alessandro de’Medici seria um dia, duque de Florença. Nada foi encontrado nos arquivos da família Medici sobre a infância de Alessandro, antes da morte de Lorenzo, duque de Urbino.
A origem humilde
Talvez o batismo de Alessandro tenha sido registrado em algum lugar de Roma, mas esta falta de informação diz muito: o filho de uma escrava não era considerado uma pessoa. Somente após a morte de Lorenzo, duque de Urbino, quando os Medici se viram em uma busca desesperada de encontrar um herdeiro, Alessandro se juntou à família.
Ele nasceu entre 1511 e 1512, filho de Lorenzo de ‘Medici e de uma mulher chamada Anna o Simunetta. Mais tarde, seu pai se tornou duque de Urbino, um pequeno e bonito centro cultural da região Marche. Lorenzo, Duque de Urbino, ficou famoso porque Maquiavel lhe dedicou a sua obra-prima, O Principe. Na época do nascimento de Alessandro, os Medici estavam exilados de Florença.
No entanto, a maioria acreditava que ele era filho de Lorenzo, Duque de Urbino, com uma serva ou uma escrava de Lorenzo, ou ainda da sua mãe Alfosina. Os documentos dos Medici, não fazem nenhuma referência entre o relacionamento de Lorenzo com Alessandro. Parece que o Duque de Urbino, nunca se interessou pelo “filho”.
Quando os inimigos zombavam de Alessandro por suas origens humildes, ele agradecia e pedia que lhe contassem onde tinha nascido, pois ele era o primeiro a não saber. Em maio de 1519, Lorenzo, duque de Urbino, morreu, Leão X e seus ministros agiram rapidamente: no mesmo no dia da morte do duque, eles reconheceram Ippolito de ‘Medici legítimo (naquele ponto, era a única esperança de garantir o dinastia).
É possível que o mesmo tenha sido feito naquela época também para Alessandro, mas no caso dele não há uma data certa. A sua legitimidade poderia ter sido reconhecida mais tarde. Seu nome aparece, no entanto, em um antigo registro do século XVII sobre o reconhecimento de bastardos em Florença, mantidos nos arquivos da cidade.
Duque de Penne
Em 1522 a posição pessoal de Alessandro era melhorada: ele tinha sido reconhecido como membro da família. Naquele ano o Imperador Carlo V designou-lhe o Ducado de Penne, um feudo do Reino de Nápoles, junto com a cidade de Campli, um pouco mais ao norte. Penne era localizada nas encostas orientais dos Apeninos, não muito longe de Pescara.
A pequena cidade medieval já era habitada antes da chegada dos romanos e muito bem fortificada. Embora não fosse tão grande quanto Urbino, sua atribuição compensou parcialmente os Medici por essa perda. Além disso, a cidade fornecia a Alessandro somas substanciais: pelo menos 3.000 ducados por ano. O mais importante: ter um ducado assegurou-lhe maior reputação. Os duques, mesmo de feudos menores, superavam, na “classificação” qualquer outro nobre. E assim, Alessandro se tornara o ilustre duque da cidade de Penne e, como único duque da família Medici, muitas vezes ele era chamado por esse título.
Os rumores sobre os planos de Clemente VII para os sobrinhos continuavam a circularem, e em maio de 1526, houve rumores de que Ippolito e Catarina teriam se casado para preservar a herança familiar. Alessandro seria destinado a se tornar cardeal.
Em 1527, após o saque de Roma, os Medici foram expulsos novamente de Florença. Enquanto Alessandro e Ippolito passaram os meses de exílio desfrutando dos campos de caça do norte da Itália, o Papa Clemente VII permaneceu com sua corte em Orvieto. Somente tempos depois a corte pontifícia retornou a Roma.
Em janeiro de 1529, o Papa Clemente VII adoeceu e os temores de que a morte estava chegando eram reais. Seus médicos tentaram os melhores tratamentos, dando-lhe rabarbo (uma planta) para purgá-lo.
Enquanto Clemente estava pensando em morrer, ele fez um último movimento para manter a família no poder. Com Florença fora de seu controle (nesta época os Medici estavam em exílio), ele deveria garantir à sua família o máximo de influência em Roma e na Igreja. Oprimido por sua doença e por medo de deixar seus herdeiros mendigando e desprovidos de qualquer defesa em 10 de Janeiro de 1529 elegeu seu sucessor: Ippolito de ‘Medici tornou-se cardeal. Enquanto para Alessandro esse movimento envolveu uma clara e inesperada mudança de perspectivas.
Se Clemente tivesse morrido, toda a história provavelmente teria um final muito diferente. Em vez disso, o papa se recuperou e se encontrou em uma situação familiar muito delicada. Com Ippolito na igreja, o único candidato a alianças dinásticas era Alessandro. Agora com dezessete anos, Alessandro tinha entrado na família há cerca de dez anos. Durante este período recebeu a melhor educação, provavelmente o suficiente para compensar a desvantagem da sua origem humilde. A intenção de que Alessandro deveria seguir a vida eclesiástica fora arquivada.
Clemente rapidamente começou a planejar um casamento para o sobrinho, inicialmente com Giulia Varano, parente do Cardeal Cibo e herdeira de pequeno ducado de Camerino. Ippolito, no entanto, não tinha intenção de continuar sendo cardeal. Enquanto Ippolito fervia de raiva por aquela nomeação indesejada, seu jovem primo atingiu a maturidade.
Em 1529 Clemente VII, assinou um tratado de paz com o Imperador Carlos V, que se comprometeu a ajudar os Medici a retornarem em Florença. Clemente VII então, pensou em uma aliança com o imperador: unir em matrimônio Alessandro de’Medici com Margherita, a filha ilegítima de Carlos V. Um matrimônio com a filha do imperador seria muito mais interessante para a família Medici.
Margarida da Áustria
Como Alessandro, Margarida era filha de uma criada. Sua mãe era a empregada Jeanne van der Gheynst. Jeanne teve um relacionamento com Carlos enquanto ele estava visitando André de Douvrin, copeiro de seu irmão, o príncipe Ferdinando, em cuja casa Jeanne trabalhava. Carlos tinha vinte e um anos na época e era solteiro. Em 1519 foi eleito imperador do Sacro Império Romano e já era o homem mais poderoso da Europa. Não sabemos muito do relacionamento de Carlos e Jeanne, somente que ele reconheceu Margarida como sua filha.
Margarida nasceu em 5 de julho de 1522. Foi batizada em Pamele, perto de Oudenaarde, uma cidade famosa pela produção de tapeçarias perto da fronteira com a atual Bélgica. No mês seguinte, sua mãe receberia uma pensão de 80 florins por ano, e a pequena Margarida foi morar com os Douvrin.
Na idade de três ou quatro anos, foi levada para a casa de Margarida da Áustria, tia de Carlos, uma mulher muito aberta para o seu tempo, cuja corte era um verdadeiro centro cultural. Provavelmente Margarida foi educada na corte dos Habsburgos. Como filha ilegítima, ela poderia se casar somente com um governante de um Estado pequeno e submisso ao Imperador. E esse homem era Alessandro de’Medici.
O retorno em Florença
Com a ajuda militar das tropas de Carlos V, os Medici conseguiram retornar em Florença. No dia seguinte, Alessandro de’Medici foi declarado chefe da República de Florença. Os Medici haviam tomado posse da cidade e Alessandro logo adotou um novo estilo de vida .
No entanto, o imperador ainda estava preocupado com o destino de Florença: ele pressionou o papa para que a República Florentina fosse sua aliada de confiança, e isso só poderia ser feito por meio da estabilidade política. Não poderia mais ocorrer mudanças de Governo ou novas alianças: a estabilidade do governo estava acima de tudo.
Assim, o pontífice deu os passos necessários: atuando como chefe da igreja, ele concedeu um título para Alessandro, enviou um despacho para Florença avisando os órgãos de governo que a partir daquele momento, Alessandro deveria ser chamado de duque da República Florentina.
Foi um gesto extremamente importante: os Medici se tornaram os nobres governantes da cidade: além disso, o título de duque era hereditário e seria para sempre ligado ao governo da cidade. O último respiro de democracia florentina estava sendo eliminado.
Os florentinos reagiram com desdém à concessão do título de duque para Alessandro de ‘Medici em 1533. No entanto, esta escolha causou apenas alguns esporádicos motins, que no entanto não levaram a uma rebelião armada, talvez porque o cerco da cidade de 1529/30 levou à população ao seu limite.
Alessandro de ‘Medici, primeiro duque de Florença, era uma estranha fusão de características físicas e ideológicas singulares: ele tinha pele escura e cabelo crespo típico dos norte-africanos, por esse motivo era chamado de “o Mouro”. Não possuía fortes habilidades intelectuais e ele era considerado por quase todos como uma pessoa sem tato.
Havia um comportamento exuberante, mas mesmo assim era talentoso nas habilidades do governo: realizava sessões regulares no Palácio Medici durante os quais ouviu com disponibilidade as queixas dos pobres. Quando lidava com as classes mais humildes e necessitadas, estava sempre atento às dificuldades. Este seu comportamento talvez resulte das origens humildes da sua mãe. Por outro lado, ninguém poderia negar que Alessandro gozava de péssima reputação entre a maior parte da elite de Florença; porém era um homem de poder.
Uma de suas primeiras ordens como duque era a obrigação de entregar todas as armas, até aquelas presentes nas igrejas como ofertas votivas. Outra decisão que também deve ser mencionada foi a demolição do antigo convento de San Giovanni Evangelista, localizado próximo às muralhas norte da cidade, e a construção no mesmo local da Fortezza da Basso, uma fortaleza vasta e inacessível, destinada a hospedar a guarda espanhola criada por Carlos V. A fortaleza teria permitido controlar o centro da cidade, além de ser usada para suprimir quaisquer distúrbios interno e também para proteger Florença de ataques externos.
O comportamento devasso
Em 1534, Alessandro foi atingido por um acontecimento triste: a morte do Papa Clemente VII, o qual era seu principal conselheiro e um forte guia moral. Com a morte do Papa, a tendência natural por um comportamento imprudente em busca de prazeres carnais de Alessandro só piorou.
Favorecido e apoiado por seu jovem e distante primo, Lorenzino de ‘Medici, Alessandro se deixou levar por uma série de casos de amor que logo se tornaram assunto de fofoca escandalizada na cidade. Foi comentado que ele escalava as paredes dos conventos à noite, que ele enganava jovens mulheres de linhagem nobre, e que comprometia a honra de mulheres casadas, além de um governo marcado por troca de favores sexuais.
No verão de 1536, o imperador Carlos V chegou em Florença acompanhado por sua filha Margherita, que iria contrair matrimônio com Alessandro, e por muitas famílias de exilados florentinos perdoados por ocasião deste evento tão importante. Mas imediatamente após o fim das comemorações e partida do imperador, a vida dos cidadãos de Florença e do duque continuaram como antes: o casamento parecia não ter feito efeito sobre os desejos sexuais excepcionais de Alessandro.
Lorenzino de’Medici
O comportamento devasso de Alessandro foi sem dúvida apoiado por Lorenzino de ‘Medici, conhecido também como Lorenzaccio, que no entanto era profundamente diferente dele. Lorenzo ou Lorenzino como era comumente chamado, nunca teve um papel importante na sociedade florentina e provavelmente não poderia aspirar grandes coisas, embora fosse muito ambicioso e decidido a mostrar a todos o seu valor. Esta combinação de elementos contraditórios fez de Lorenzino um personagem complexo e instável.
O pai dele era um Medici, originário do ramo secundário da família, irmão de Cosimo, o Velho. Assim Lorenzino se considerava o herdeiro de uma grande linhagem, e sua mãe era uma Soderini, ou seja, pertencia a uma família histórica de Florença.
Lorenzino cresceu em Roma, onde adquiriu um conhecimento profundo da cultura humanística; na verdade ele poderia citar de cor passagens de Cícero e Maquiavel. Ele gostava de exibir seu conhecimento.
Ao chegar em Florença, fez de tudo para se aproximar de Alessandro e ganhar a sua simpatia. Mas na verdade, os sentimentos de Lorenzino eram outros: ele desprezava o duque, sentia inveja e provavelmente um grande ódio.
Lorenzino conseguia mascarar estes sentimentos e se atormentava com a ideia de que Alessandro, um ignorante e bastardo, tinha todo o poder e dinheiro que poderia desejar; e ele, Lorenzino, um verdadeiro Medici, com uma mente brilhante, estava totalmente desprovido de poder. A aproximação de Alessandro só alimentou o profundo e exagerado ressentimento de Lorenzino.
A morte de Alessandro
Quanto mais Lorenzino refletia, mais sua imaginação funcionava: se ele tivesse libertado Florença de seu tirano ilegítimo, ele se tornaria seu natural sucessor; afinal, era um descendente nobre e legítimo dos Medici.
Esta fantasia em algum momento assumiu uma tal dimensão para fazê-lo pensar que poderia transformá-la em realidade: foi assim que Lorenzino começou a planejar o assassinato de Alessandro. Neste caso, ao contrário de outros assassinatos planejados em Florença, ele não teria organizado uma conspiração. Na verdade ele decidiu cuidar disso sozinho com a ajuda de um único assassino.
O plano foi habilmente elaborado: Lorenzino começou a estimular o interesse de Alessandro por uma mulher chamada Caterina Soderini Ginori, casada com um homem idoso.
Lorenzino garantiu ao primo que realmente havia começado a falar lisonjeiramente sobre ele para Caterina (que era também a tia materna di Lorenzino). Logo após o ano novo de 1537, Lorenzino confidenciou a Alessandro que Caterina era profundamente interessada por ele e disse-lhe que tinha marcado um encontro com ela no sábado seguinte, ou seja, na noite da Epifania, uma festa a qual todo tipo de diversão era permitido.
Alessandro deveria ir até a casa de Lorenzino e esperá-lo: ele chegaria em pouco tempo com Caterina. O Duque chegou ao local combinado e, após ter recomendado o guarda-costas que esperasse por ele do lado de fora, entrou na casa de Lorenzino sem ser notado pelas pessoas que celebravam pelas ruas.
Como acontecia sempre, àquela hora da noite, Alessandro estava completamente bêbado. Entrou cambaleando no quarto, tirou a espada, se despiu e deitou na cama para esperar a chegada de Caterina. De repente, adormeceu.
Tudo o que aconteceu depois foi relatado por Lorenzino, que forneceu versões ligeiramente diferentes. Os detalhes variam, mas o fato central é sempre o mesmo. Naquela noite, algumas horas depois, Lorenzino entrou silenciosamente no quarto onde Alessandro dormia, acompanhado por um sicario, conhecido como Scoronconcolo. Lorenzino se aproximou da cama e imobilizou Alessandro, enquanto Scoronconcolo o acertou com um punhal.
Enquanto Alessandro lutava vigorosamente para libertar-se, Lorenzino cobriu a sua boca com a sua mão para que ele pudesse gritar e Scoronconcolo continuou a acertá-lo com o punhal. Na luta Alessandro mordeu os dedos de Lorenzino. Assim, Scoronconcolo conseguiu afundar o punhal na garganta do Duque. O corpo de Alexander ficou imóvel nos lençóis encharcados de sangue. E assim o primeiro Duque de Florença foi assassinado.
Lorenzino estendeu um cobertor sobre o corpo e colocou uma nota sobre ele com uma citação da Eneida de Virgílio: “Vincit amor patriae laudumque imenso cupido ” (conquistará o amor de pátria e o desejo imenso de glória). O seu gesto deve ser considerado como o feito heróico de um assassino ciente de sua própria ação. Os dois criminosos saíram da sala, Lorenzino fechou a porta e colocou a chave no bolso, já que ele não queria que o cadáver fosse descoberto antes que ele deixasse a cidade. Assim, ele montou um cavalo e fugiu com pressa.
A fuga de Lorenzino
Lorenzino fugiu para o norte, mas, para se livrar de seus rastros, demorou alguns dias para chegar a Veneza. Lá ele foi bem recebido por um exilado florentino, Filippo Strozzi, chefe de uma importante família de banqueiros. Lorenzino sabia que demoraria algum tempo para resolver as coisas, mas esperou com confiança ser chamado de volta para Florença, e ser aclamado em seu retorno como herói.
No entanto, os eventos em Florença não aconteceram como Lorenzino havia imaginado. Devido à porta fechada, o corpo de Alessandro não foi descoberto imediatamente. Finalmente, no dia seguinte, a porta foi arrombada e o corpo de Alessandro foi descoberto. O Cardeal Cybo, que além de ser um homem de confiança do imperador era também um Medici, juntamente com Francesco Guicciardini, decidiu manter o crime em segredo.
O cadáver foi transportado na escuridão para ser escondido na tumba dos Medici dentro do complexo de San Lorenzo. Quando o corpo de Alessandro, cerca de 350 anos depois, foi exumado, os vestígios dos golpes de punhal confirmaram a história de Lorenzino.
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