Às vezes as musas são incorporadas em figuras femininas que se tornam um ícone e uma referência para toda uma geração de artistas. É o caso de Simonetta Vespucci, a musa de Botticelli (1453-1476). Simonetta era considerada a mulher mais bonita do Renascimento, a Vênus viva, que encantava artistas e que morreu muito jovem. Sua beleza se tornou um mito da Renascença.
Quem foi Simonetta Vespucci
Simonetta Cattaneo Vespucci nasceu provavelmente em Portovenere de uma nobre família da Ligúria, os Cattaneo.
Tornou-se esposa do banqueiro florentino Marco Vespucci, primo do famoso navegador Américo, que deu o nome ao continente americano. Com apenas quinze anos de idade, Simonetta mudou-se para Florença onde tinha uma vida tranquila, até conhecer Giuliano de ‘Medici, o irmão mais novo de Lorenzo, o Magnífico.
Provavelmente Giuliano a viu retratata na oficina de Botticelli. Os Medici tinham tudo. Eles eram ricos, cultos, poderosos, bem representados no período áureo que Florença vivenciava. E se Lorenzo encarnava a administração do poder, o bonito e idealista Giuliano expressava toda a alegria de viver no Renascimento.
O poeta Poliziano, em sua famosa composição Stanze per la giostra, narrou que em 1475 foi realizado um torneio de cavaleiros na Piazza Santa Croce. O prêmio seria um estandarte com um retrato de Simonetta pintado por Sandro Botticelli. Giuliano, fortificado pelo amor que ardia em seu peito, vestido com uma deslumbrante armadura de prata cravejada de pedras preciosas e o capacete desenhado por Verrocchio, venceu o torneio cavalheiresco.
No estandarte Simonetta era coroada como rainha do torneio, representada como Atenas com os pés apoiados em um ramo de oliveira em chamas, sobre o qual era escrito o lema francês “La Sans Par”, “A Incomparável”. Na oliveira em vez, um cupido acorrentado com um arco quebrado. Toda a composição se referia ao tema do amor cortês, de modo que a mulher amada era considerada sublime e inatingível.
Mas aparentemente esta não foi a única vitória: o jovem conquistou também o coração da Musa do Renascimento. Talvez o amor entre Giuliano e Simonetta fosse apenas platônico. O que é certo é que eles se tornaram o casal mais admirado da Renascença.
Simonetta era magra, com cabelos loiros (uma característica não muito comum na Itália daquela época). As mulheres florentinas clareavam os cabelos para ficarem na moda, e Simonetta era loira naturalmente. Todas essas características lhe valeram o título de a “Bella” de Florença, a “Senza Paragone” ou seja, a incomparável.
Foi considerada pelos seus contemporâneos como a mulher mais bonita de Florença. Todos os artistas da época tentaram representar a sua beleza etérea, mas ninguém conseguiu mais do que Botticelli. De fato, suas feições delicadas e suaves, seus cabelos loiros e brilhantes podem ser encontrados nas duas obras mais famosas do artista: O Nascimento de Vênus e A Primavera.
Simonetta Vespucci também foi a musa de muitos outros artistas, incluindo Piero di Cosimo, Verrocchio, Ghirlandaio, Filippo Lippi e poetas como Poliziano, Pulci e até mesmo Lorenzo, o Magnífico.
A morte de Simonetta Vespucci
Mas o clima artístico-criativo florentino estava prestes a mudar. O primeiro golpe nesse cenário de beleza e esplendor foi a morte de Simonetta em 26 de abril de 1476 (talvez de tuberculose), um ano depois da memorável Giostra.
Sabemos da doença e da morte de Simonetta através das cartas que o seu sogro Piero Vespucci escreveu para Lorenzo o Magnífico, que naquela época estava em Pisa, tratando dos negócios da nova universidade. Preocupado com a saúde de Simonetta o Magnífico pediu o seu médico de confiança, o Maestro Stefano para visitá-la. Talvez isso justifique as diversas cartas escrita por Piero Vespucci.
A primeira carta é datada de 18 de Abril e Piero conta a Lorenzo, que a saúde de Simonetta está do mesmo jeito, de quando Lorenzo partiu para Pisa. Dois dias depois, Piero escreveu uma outra carta, dizendo que graças a Deus e ao Maestro Stefano, Simonetta estava um pouco melhor: tem menos febre e falta de ar, que come e dorme melhor.
No dia 23 de Abril Piero escreve uma outra carta: a saúde de Simonetta piorou e o médico enviado por Lorenzo e o médico da família Vespucci não estão de acordo com o tipo remédio que a jovem deve tomar. Diz ainda nenhum remédio está dando resultados. Os dois médicos divergem também sobre a doença de Simonetta: Maestro Stefano diz que não acredita ser tuberculose e o Maestro Moyse, médico dos Vespucci, pensa o contrário.
O certo era que Simonetta respirava com dificuldade, tinha febre, vômitos, pouco apetite e dormia mal. Poderia ser uma pulmonite ou bronco pulmonite, que naquela época poderia ser fatal. Não temos as cartas escritas por Lorenzo; não sabemos nem se ele respondeu as cartas de Piero Vespucci.
No dia 26 de Abril de 1476, Simonetta era morta. O funeral foi realizado no dia seguinte. Vestida de branco como uma noiva. Simonetta atravessou a cidade dentro de um caixão com o rosto e o corpo descobertos para que todos pudessem ver que nem a morte conseguiu desfigurar tanta beleza. Era a última vez que o povo floretino admirava a sua musa.
A cidade inteira ficou chocada e tocada pelo que aconteceu. Para sua morte, Lorenzo, o Magnífico, escreveu o soneto que começa com
“O chiara stella che co’ raggi tuoi/togli alle tue vicine stelle il lume…” (O clara estrela, que com seus raios tira das estrelas próximas a luz). No soneto, Lorenzo imagina Simonetta subindo para o céu para enriquecer o firmamento.
Simonetta foi enterrada na igreja de Ognissanti em Florença, na capela Vespucci. Na mesma igreja, no chão há também o túmulo de Botticelli que pediu para ser enterrado aos seus pés. Exatamente dois anos depois, Giuliano também morreu, assassinado na Conspiração dos Pazzi, que marcou o fim do momento mais esplêndido da Florença Medicea.
Idealizada como um símbolo vivo de beleza e graça, inspirou, mesmo depois da sua morte prematura, poetas e pintores do círculo de Lorenzo, o Magnífico.
Sete anos depois, Piero di Cosimo pintou uma Cleópatra com a aparência de Simonetta, com uma áspide em volta do pescoço: provavelmente uma lembrança da sua morte prematura. Mas a cobra também é um símbolo erótico. A pintura, de fato, gira em torno dos conceitos de vitalidade e morte iminente. Uma morte que não poupou nem mesmo a frágil musa do Renascimento Florentino.
6 comentários
lara · agosto 4, 2020 às 6:06 pm
não é a resposta que eu precisava
Cristiane de Oliveira · agosto 10, 2020 às 11:36 am
Oi Iara! O que você estava procurando?
Maicon Paiva · novembro 28, 2020 às 9:22 am
Esse ano de 2020 foi tudo muito complicado cada vez uma
nova bomba aparecia. Espero que 2021 seja mais calmo.
Super agradeço pelo seu artigo foi bem útil. Compartilhei
no meu pinterest e obrigado pela informação.
Cristiane de Oliveira · dezembro 2, 2020 às 2:10 pm
Também espero que 2021 seja mais tranquilo para todos. Obrigada por compartilhar o nosso conteudo
Danielle Foucaut Dinis · fevereiro 9, 2023 às 9:45 am
Obrigada pelo texto explicativo sobre SIMONETTA, a minha curiosidade foi despertada pela leitura de um poema de Sophia Mello Breyner ANDERSEN, que fala de, “assassinato de Simonetta Vespucci”. Nada no poema esclarece o uso de uma palavra tão forte como título desse poema. Fiquei na mesma, não percebo o poema em si muito hermético.
Ceci · março 8, 2023 às 12:19 am
Eu não conheço esse poema. Vou procurar, fiquei curiosa!