O nome de Florença é conhecido mundialmente pela sua história, seus magníficos palácios e seu patrimônio artístico. Hoje vamos conhecer um capítulo triste da história da cidade: a segunda guerra mundial em Florença.
Itália entra em guerra
Quando Benito Mussolini em 10 de junho de 1940, proclamou a entrada da Itália na segunda guerra mundial, toda a cidade de Florença se reuniu na Piazza della Signoria em apoio a decisão do Duce.
Na verdade, os florentinos nos dois primeiros anos de guerra não se preocuparam muito, pois era quase uma hipótese ver nos céus da cidade sobrevoar os aviões ingleses e americanos. Florença, cidade da beleza e da arte… Quem ousaria atacar o patrimônio histórico desta cidade? Os tesouros de Florença, pertenciam a humanidade. Mas bem cedo, após diversas derrotas militares, a realidade de uma guerra mostrará a população florentina, a sua face mais trágica.
A ocupação Alemã
Após a queda do fascismo em 08 de setembro de 1943, Florença foi invadida pelo exército de Hitler, que procede com uma sistemática ocupação e exploração dos recursos e da população florentina. Naqueles meses dramáticos a cidade vive uma época de escuridão pois apesar dos acordos feitos, os nazistas saqueiam obras de arte, palácios históricos, objetos preciosos das famílias nobres e das igrejas.
Mas o drama de Florença não é somente o saqueamento de obras de arte e objetos preciosos, o verdadeiro drama será, como em todas as outras cidades europeias ocupadas pelos alemães, a população. Quando o vento da sorte parou de soprar para os alemães, ao Fuhrer (em alemão, guia, chefe, condutor, líder) serve mão de obra, ou seja, soldados para serem enviados ao fronte, e quem não aceita é punido com a fuzilação.
Mas os florentinos não se rendem. Com os meios que tinham a disposição, dando prova de grande coragem que nasce do desespero, a “resistência florentina”, chamada de Partigiani, se organiza, respondendo as violências nazifascistas. Com poucas armas a disposição, mas com a ajuda e a proteção da população, os partigiani florentinos enfraquecem o poder militar dos alemães através de atentados, sabotagem e represálias.
Os aliados se aproximam
Com a proximidade das tropas aliadas é que o drama de Florença, chega ao ápice. Em julho de 1944, os alemães decidem de deixar o Oltrarno (parte da cidade do outro lado do rio Arno) para os aliados. O lado norte de Florença se transforma um destacamento militar com o dever de proteger a retirada do exército alemão que ia em direção à linha gótica.
Na tarde do dia 29 de julho de 1944, uma ordem foi colocada nos palácios do centro histórico impondo que os cidadões liberassem imediatamente as áreas próximas ao rio Arno. Entre eles estavam os doentes internados no hospital San Giovanni di Dio. Toda a área deveria ser evacuada até as 12h do dia seguinte.
Era um tempo muito pequeno para encontrar um novo abrigo e efetuar a mudança dos objetos pessoais, tendo em vista que o toque de recolher era as 22 horas. Se calcula que naquela ocasião cerca de 150.000 pessoas tiveram que abandonar as casas onde sempre viveram, levando consigo pouquíssima coisa. Foram abrigadas em precárias condições higiênicas e alimentares cerca de 50.000 pessoas no Palazzo Pitti e no Jardim de Boboli.
No dia 31 de julho, foram impedidas as passagens pelas pontes. Era claro a decisão de destruir as pontes para atrasar o avanço das tropas aliadas. Nos dias 01 ao 03 de agosto a cidade vive uma espera agonizante. As noites do dia 01 e 02 de agosto foram iluminadas pelos tiros de armas de grande calibres dos aliados que batiam a última resistência alemã antes da entrada do centro histórico de Florença.
No dia 02 de agosto, o cônsul suíço Carlo Steinhauslin, após tentar convencer os alemães de repensarem sobre o destino das pontes, solicitou de poder salvar ao menos as quatro esculturas colocadas na Ponte Santa Trinità, o que foi em vão, pois era impossível encontrar carros e homens para remover as esculturas pesadas da ponte. Um destino cruel esperava a ponte mais bonita de Florença: iria saltar no ar juntamente com as 04 estátuas que representavam as estações do ano.
A destruição das pontes
No dia 03 de agosto a situação precipitou e às 14 horas, os alemães proclamaram o estado de emergência. Foi ordenado que todos os florentinos não saissem de casa. Os alemães tinham ordens de atirar em qualquer pessoa que circulasse pelas ruas da cidade ou ainda se olhassem pelas janelas de casa. Os partigiani tentaram, sem sucesso, salvar pelo menos a Ponte alla Vittoria, cortando os fios que uniam as minas. O destino das pontes de Florença, naquele momento, já estava decidido. A agonia das pontes estava para chegar ao fim.
Um silêncio irreal tomou conta da cidade na noite do dia 03 agosto: às 22 horas foi bloqueada a central telefônica enquanto a Ponte Rubaconte explodia. A Ponte Rubaconte (reconstruida com novo nome Ponte Alle Grazie, era a ponte de pedra mais antiga da cidade. A única ponte que sobreviveu as diversas inundações do rio Arno, foi a primeira a cair com as minas alemães.
Entre as 2h30 e 4h do dia 04 de agosto, uma série de explosões destruíram mais 05 pontes de Florença: Ponte Santa Trinita, Ponte alla Carraia, Ponte Alla Vittoria e Ponte San Niccoló. Entre as 22h do dia 03 e 04h do dia 04 de agosto, a cidade de Florença sofreu com 30 explosões. Provavelmente quem estava longe, ao sentir os rumores não se dava conta se explodiram as pontes ou a inteira cidade.
A Ponte Santa Trinitá, obra de Bartolomeo Ammanatti, projetada por Michelangelo, resistiu a primeira explosão, mas foi somente uma prorrogação da sua agonia. Na segunda tentativa, a Ponte Santa Trinitá também “saltou” nos ares.
A Ponte Vecchio foi a única que sobreviveu as minas alemães. Ao seu redor, saltaram no ar as antigas casas e torres medievais, destruindo para sempre uma das áreas mais características da cidade. Era impossível de transitar pela Ponte Vecchio, devidos aos enormes acúmulos de destroços dos palácios e torres medievais.
As vibrações eram sentidas em todo território florentino, como se tivesse acontecido um terremoto. Alguns afrescos do teto da Galleria degli Uffizi se esfarelaram, cobrindo os corredores de detritos. Segundo o paroco de San Lorenzo, algumas pedras da Ponte Santa Trinità chegaram até a Piazza Madonna. Um pesado fragmento da Ponte Alla Carraia, destruiu o teto da igreja de S. Lucia al Prato.
O movimento feito pelo ar durante a explosão foi tão grande que abrira as portas de todos os apartamentos localizados próximos a explosão. Naturalmente, teve uma chuva de vidro proveniente das janelas de muitos apartamentos da cidade. Muitos florentinos se refugiaram nos porões das casas, como se tivesse um bombardeio aéreo.
O Senhor Papini, proprietário de uma loja de produtos de couro localizado no Lungarno Archibusieri conseguiu salvar a porta de cristal, pois quando os alemães saquearam a loja, deixaram a porta aberta. Uma inteira nuvem de poeira e fumaça cobriu a cidade até o final da manhã o dia 04 de agosto.
Se a Operação Feuerzauber, como era chamada pelos alemães, tivesse seguido os planos iniciais, a destruição de Florença teria sido muito maior. Foram descobertas um grande número de minas inutilizadas próximas a Ponte Vecchio. Além de minas no Corredor Vasari, no Lungarno Archibusieri e nos arredores da igreja de Santa Felicitá. Isso demostra que existia um projeto muito mais destrutivo, que por motivos desconhecidos, não foi seguido. A única explicação seria uma escolha menos traumática no último minuto.
A única pessoa que poderia tomar essa decisão era o Generalfeldmarschall Kessenlring que na manhã de 03 de agosto, poucas horas antes da destruição das pontes chegou em Florença. Muitas fotos mostram o Corredor Vasariano minado na parte norte da Ponte Vecchio.
Naquela mesma noite, quando as tropas aliadas, acolhidas pela população, entraram pela Porta Romana, se deram conta que a cidade foi liberada pelos próprios florentinos. Os primeiros soldados aliados a chegarem foram os da Africa do Sul às 4h45 da manhã. Depois chegaram os ingleses.
Fonte bibliografica:
Firenze Ferita – Fotos
Firenze Guerra & Alluvione – Paolo Paoletti
Achou este artigo interessante?
Compartilhe em sua rede de contatos do Twitter, no seu mural do Facebook. Compartilhar o conteúdo que você considera relevante ajuda esse blog a crescer. Grazie!
6 comentários
Cláudio Pinheiro Gomes · agosto 5, 2019 às 2:18 am
Tive a experiência mágica de visitar Florença. Não conhecia esse detalhe da história. Não tenho palavras para elogiar tão magnífico documentário. Bravissimo!!!
Cristiane de Oliveira · agosto 5, 2019 às 8:51 am
Caro Cláudio,
Obrigada pela participação. O texto fico ficou faltando informação sobre o roubo das obras de artes, algumas foram recuperadas, e outras não. Em breve escreverei outro artigo somente sobre as obras.
Cláudio Pinheiro Gomes · agosto 5, 2019 às 2:22 am
A novembre 2018 ho visitato Firenze. Un’esperienza indescrivibile e magica! Ma non conoscevo questa parte della storia. Non ho parole per classificare un documentario così brillante. Sei stata Bravissima, Signora Cristiane de Oliveira, Bravissima!!!
Cristiane de Oliveira · agosto 5, 2019 às 8:51 am
Grazie mille Cláudio! Molto gentile!
Dirceu Ponsoni · agosto 6, 2019 às 4:22 pm
Muito bom o documentário, parabéns!
Estive duas vezes em Florença, e é inacreditável a que ponto pode chegar o ser humano, destruindo um patrimônio tão maravilhoso.
Cristiane de Oliveira · agosto 7, 2019 às 3:37 pm
Obrigada Dirceu! O dia em que o homem compreender que a guerra destroi tudo, não somente o patrimônio arquitetônico, mas principalmente a dignidade humana, ela será banida da face da Terra. Um abraço de Florença!