No artigo de hoje vamos conhecer Piero, o Fátuo e os motivos pelos quais os Medici foram expulsos pela segunda vez de Florença.
Piero, filho primogênito de Lorenzo o Magnífico e Clarice Orsini, entrou para a história com o apelido de “O Fátuo” e “O Desafortunado”.
Lorenzo escolheu Angelo Poliziano como seu tutor, que lhe ensinou grego e latim; em 1479, por desentendimentos com Clarice Orsini, que formulava ressalvas sobre a formação a ser dada às crianças, Poliziano, foi substituído por Bernardo Michelozzi.
O batismo político de Piero aconteceu aos 12 anos de idade, quando foi enviado a Roma, juntamente com os embaixadores florentinos para prestar homenagem ao papa Inocêncio VIII.
Lorenzo demonstrava muita preocupação em relação ao filho, pois já tinha percebido que ele não era a altura do cargo, além de demonstrar excessiva ostentação, especialmente com roupas muito luxuosas.
Piero era fisicamente forte, de rosto bonito. Passava grande parte do seu tempo fazendo exercícios físicos e se divertindo. Ele não era um homem burro, mas era somente um dos tantos nobres jovens da sua época que não tinha uma inteligência fora do comum.
O matrimônio com Alfosina Orsini
Logo Lorenzo procurou um matrimônio adequado para o filho. A escolhida foi Alfonsina Orsini, romana, da mesma família da mãe de Piero. O matrimônio aconteceu em maio de 1488. Alfosina se revelou muito hostil e nunca conseguiu se adaptar ao ambiente florentino. Mais um motivo de insatisfação do povo florentino. Como o governo dos Medici dependia principalmente do apoio popular, Piero foi muito desafortunado na escolha da sua esposa. Dessa união nasceram: Clarice, Lorenzo – futuro duque de Urbino e pai de Catarina de’Medici.
Piero assume o controle
Após a morte do pai em 1492, Piero assumiu o controle de Florença e da família. Ele não tinha o carisma e nem a habilidade política do seu pai. A sua primeira derrota foi com o Papa Rodrigo Borgia. Piero foi até Roma tentar um acordo matrimonial de Lucrezia, filha do Papa, com o seu irmão Guiliano Duque de Neumours. O Papa Borgia, não deu nem confiança.
Na política interna, Piero de’ Medici foi um desastre. Ele atraiu muitas hostilidades, entre as quais, as mais curiosas vieram de seus primos, membros do ramo denominado “secundário” que organizaram uma conspiração contra ele. A conspiração falhou, os primos foram expulsos, mas o sinal negativo foi forte e claro.
A nível cultural, Piero foi um fiasco. Totalmente desinteressado por qualquer forma de conhecimento – embora não fosse ignorante – o jovem Medici tinha péssimas relações com todos os artistas que seu pai amava, inclusive com Michelangelo Buonarroti. Sabemos que Piero, durante a grande nevasca de janeiro de 1494, mandou Michelangelo fazer uma estátua de neve.
Carlos VIII, rei da França
Quando Piero entrou no comando da cidade, uma tempestade estava para assolar a Península Itálica. Para conter esse temporal, chamado Carlos VIII, era necessário toda a habilidade política de Lorenzo o Magnífico, coisa que Piero não tinha.
Carlos VIII, rei da França, decidiu atravessar os Alpes para retomar o Reino de Nápoles sobre o qual ostentava direitos hereditários. Na verdade, Carlos VIII não tinha interesse no território florentino – ele só queria passar para chegar no sul da Itália.
Inicialmente, exército francês ocupou a fortaleza de Sarzana, mal defendida pelas tropas de Piero. Piero tentou um acordo com o rei. A tentativa diplomática se revelou um fracasso total. Piero não só não se opôs à sua passagem pelos territórios da República de Florença, como também se sujeitou a uma humilhante e incondicional rendição permitindo ao rei francês de ocupar algumas áreas estratégicas: Pisa, Livorno, além das fortalezas de Sarzana , Sarzanello, Ripafrata e Pietrasanta.
A situação era muito delicada. As tropas francesas eram superiores àquelas de Piero. O jovem Medici sabia que Carlos VIII em poucos dias conquistaria as áreas estratégicas que foram cedidas ao rei. No final para Piero, o acordo não era tão ruim. Talvez realmente ele não tivesse muitas escolhas. O grande erro de Piero foi ofender o sentimento republicano que não desejava se render sem combater.
O exílio de Piero o Fátuo
O episódio incendiou as mentes anti-Medici em Florença e deu a Savonarola, que não era mais contido por Lorenzo, uma lufada de ar fresco. Os Priores, que eram aqueles que tinham o cargo efetivo de governar Florença, e a opinião pública o consideraram um traidor, que capitulou sem combater o estrangeiro.
Em 9 de novembro de 1494, o povo se rebelou, atacou o palácio Medici e estabeleceu uma estranha república com um sabor teocrático que foi afetada pela forte influência do frade dominicano. O ramo principal da família Medici foi exilado, enquanto o secundário, foi chamado de volta à sua terra natal e adquiriu o nome de “Popolano” para se distinguir dos parentes odiados.
Este episódio constituiu a segunda expulsão dos Medici de Florença depois daquela ocorrida com Cosimo, o Velho. Piero e sua família, incluindo Guilio, filho de Giuliano, partiram de Florença durante a noite, sob o pesadelo da fúria popular.
Este foi um exílio diferente daquele de Cosimo o Velho. Desta vez, tudo que foi construído pelos primeiros Medici foi destruído. A família voltou na mesma situação nos tempos de Giovanni di Bicci, antes da fundação do Banco Medici.
Por cerca 18 anos os Medici viveram no exílio, como nômades sem poder usufruir dos bens que a família possuía. Piero viveu os nove anos seguintes, antes de morrer, tentando reentrar em Florença, mas sem sucesso.
Em 1499, Piero se separou dos irmãos Cardeal Giovanni, Giuliano e do primo Guilio. Os três resolveram deixar a Itália e viajaram pelos principais países europeus.
O saque do Palazzo Medici
Após a fuga do Medici, o palácio da família foi invadido pela multidão enfurecida que o esvaziou de grande parte do mobiliário. A Senhoria, por sua vez, se apropriou de cerca 20 mil ducados depositados no Banco Medici. Sobre a cabeça de Piero foi posta uma recompensa de cerca 4 mil florins.
Todos os tesouros acumulados ao longo dos anos por Cosimo o Velho, Piero de’Medici e Lorenzo o Magnífico estavam em perigo, praticamente jogado aos quatro ventos. Assim foi destruída a maior coleção de tesouros artísticos da Europa: manuscritos em diversas línguas, quadros, esculturas antigas, pedras preciosas, vasos. Entre os objetos que foram roubados e reencontrados oito anos depois, foram os vasos de Lorenzo, os quais foram colocados em venda em 1502.
Isabella d’Este , marquesa de Mantova, escreveu a Leonardo da Vinci, que estava em Florença naquele ano, pedindo para lhe informar os preços dos objetos colocados em venda. Leonardo, em êxtase diante de tanta beleza, informou que nos vasos eram impressos o nome de Lorenzo e que o preço daquele de cristal era 350 ducados; o vaso de jaspe incrustado de pérolas e rubis com pedestal de prata custava 150 ducados. O preço provavelmente era muito alto para Isabella, pois ela não efetuou a compra. Os vasos permaneceram em Florença e cinquenta anos depois foram recomprados por Cosimo I de’Medici e hoje são expostos no Museu Tesouro do Grão-Duque no Palazzo Pitti em Florença.
Uma das esculturas retiradas do Palazzo Medici serviu de monumento e recordação da expulsão dos Medici: a Judite e Holofornes de Donatello. A obra foi encomendada por Cosimo o Velho para decorar o centro do pátio do Palazzo Medici. A Senhoria colocou a obra em frente ao Palazzo Vecchio, onde hoje tem uma réplica, com uma inscrição na base que dizia que a escultura foi colocada ali para servir de aviso para quem ousasse tiranizar Florença.
A morte de Piero o Fátuo
Piero o Fátuo depois de ter tentado sem sucesso e de várias maneiras retornar á Florença, foi nomeado por Luís XII da França governador de Cassino. Pouco depois, em 1503, Piero morreu sem glórias se afogando no rio Garigliano juntamente com alguns soldados franceses.
Piero foi sepultado na Abazzia de Montecassino, distante da sua pátria, sem honras e sem um monumento fúnebre digno de um Medici. Somente anos mais tarde, quando seu primo Giulio, filho de Guiliano de’Medici, sentou no trono de São Pedro como Papa Clemente VII, é que Pedro ganhou uma tumba digna. O monumento foi realizado por Antonio e Battista da Sangallo.
Com a morte de Piero, o comando da família Medici ficou nas mãos do seu irmão, o Cardeal Giovanni de’Medici, futuro Papa Leão X.
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